Atualidade de Jackson de Figueiredo  

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Atualidade de Jackson de Figueiredo

Hamilton Nogueira*


Há trinta anos, no dia 4 de novembro, falecia tragicamente Jackson de Figueiredo. Lembro-me ainda das palavras de D. Sebastião Leme ao tomar conhecimento da morte do seu grande amigo: “foi um herói cristão”.

Sim, Jackson de Figueiredo foi um herói cristão. Foi um herói ma sua árdua luta contra o farisaísmo católico, na sua renúncia ao conforto, na sua dedicação à causa que abraçou com entusiasmo – a recristianização da inteligência brasileira.

Para a realização do seu objetivo fundou esta revista [A Ordem] , em 1921, e no ano seguinte o Centro D. Vital.

Autodidata, escreveu aos vinte anos as suas “Reflexões sobre a Filosofia de Farias Brito”, obra única no Brasil pelo vigor de expressão e pela audácia do pensamento.
A importância desse livro de Jackson de Figueiredo foi assinalada na época em que foi publicado por Nestor Victor. O ilustre crítico paranaense pressentiu na confissão espiritualista do jovem escrito, o cristão autêntico que iria mais tarde iniciar no Brasil a renovação do pensamento católico.

Uma leitura meditada das obras de Jackson de Figueiredo mostra-nos a identidade das suas idéias com as idéias das correntes filosóficas mais atuais nesta hora incerta e amarga que o mundo atravessa.

Jackson foi, sem saber um dos precursores, no Brasil, da filosofia existencial. Não tendo conhecido Kierkegaard, a sua obra, no entanto, está no plano kierkegaardiano. Nela, sobretudo nas “Reflexões sobre Filosofia de Farias Brito” e em “Pascal e a Inquietação Moderna” verifica-se que o pensamento da vida é dominado pelo primado da vida realmente vivida.

No seu diário íntimo encontra-se esta expressão: “a vida é mais forte que a mais forte das filosofias”.

Daí, a atração que sentiu por Pascal, em cuja angústia ele via um símbolo do mundo moderno. Pascal e Farias Brito libertaram o pensamento do jovem sergipano da influência de Nietzsche, e mais tarde o seu encontro com o tomismo foi uma nova fonte de renascimento espiritual. Entretanto, o que mais o seduzia no Doutor Angélico era a nota de humana ternura que ressalta a cada momento na “Suma Teológica". Dos comentadores modernos de São Tomás o Padre Pierre Rosselot era o mais apreciado por ele. “O intelectualismo de S. Tomás“, do jovem jesuíta morto na guerra de 1914, era lido e relido por ele. Não se cansava de ler para os seus companheiros do Centro D. Vital esta página de Rousselot: “Le XVII e. siécle, qui n’a guère compris La metaphysique thomiste, apréciait davantage lês parties Morales de a Somme. Mais qui fera sentir à nos contemporains ce gout de ardent, cette tendresse grave, forte, presque infinie pour l’humanité, qui s’exhale de toutes lês pages Du Docteur angélique? Qui leur fera sentir que sous lês formues limpides, nettes concises, pleines de sens, palpite de um enthousiasme passioné pour ce qu’un autre penseur catholique appelait “La splendide nature humaine?” palpiter, c’est terme qui signifiat, de tensité extreme de l’amour sans rien suggérer d’inquiet, de qui eb voile La vivacitpe aux yeux i nattentifs. Onde se plaint quelquefois de be pás retrouver dans lês questions Morales de La Somme se qu’on pourrait appeles l’odeur humain de l’Ethique à Nicomaque. Auprès d’Aristote si concret, si vécu, realiste, l’on este tente de juger Saint Thomas pâle et abstrait. Mais à mesure qu’on se familiarise, L’on sent cette impression s’évanouir. Lês expressions lês plus courantes (bonun conversationis humanae, pax multitudines, recta civium ordinatio) s’illuminent dans Lensemble de La pensée thomiste, et ouvrent dês perpectives inteligibles infinies.”

No plano religioso Jackson de Figueiredo foi essencialmente um homem de ação, um soldado de Cristo. Repugnava-lhe o indiferentismo religioso, o catolicismo amorfo e sem vida. Daí seu entusiasmo por D. EME e por D. Vital. “Coluna de Fogo” e “Afirmações” expressam o seu horror à confusão ou a “extralimitação das coisas no mundo moral”, como costumava dizer. Havia necessidade de distinções e de definições. Como kierkegaard era uma “espécie de policial da eternidade.” O catolicismo, para ele é vida, e testemunho. Não suportava qualquer espécie de hipocrisia. Para ele, maior valor tinha um positivista convicto e sincero do que um católico fazendo concessões ao erro. Deixou-nos há trinta anos, em plena mocidade. Parece que foi ontem. Os seus olhos claros, que deixavam transparecer a luminosidade da sua grande alma, continuam a contemplar-nos.

A obra que iniciou foi continuada pelos seus amigos. A sua memória perdura em quantos o conheceram e amavam. As suas idéias e o seu exemplo fizeram crescer o rebanho do Senhor.


*NOGUEIRA, Hamilton. Atualidade de Jackson de Figueiredo. A Ordem, Rio de Janeiro, v. 60, n. 5, p. 337-339, nov. 1958.


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